PL das Fake News: Google alterou resultados de suas buscas? Entenda projeto

14 de junho de 2023

O PL das Fake News pode piorar sua internet? Essa era a sugestão de um link que aparecia na primeira página do Google desde o dia 1 de maio, que exibia uma mensagem afirmando que o Projeto de Lei 2630/2020 poderia “aumentar a confusão” sobre que é verdade e o que é mentira.

No dia 2 de maio, a plataforma retirou o conteúdo da página inicial após medida cautelar do ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), que teve prazo de duas horas para cumprimento. Entre as medidas estava a obrigação de sinalizar que a mensagem contra o PL das Fake News se trata de publicidade e “veicula uma contrapropaganda em favor do PL das Fake News”.

Notificado pelo Ministério Público Federal de São Paulo, o Google teve 10 dias para dar explicações sobre a suposta alteração na primeira página de resultados de seu buscador e sobre anúncios sem identificação de publicidade contra o projeto de lei, que também aparecem na plataforma.

Uma pesquisa veiculada pela UFRJ aponta que o Google tem promovido conteúdo desinformativo sobre o PL 2630, além de enviesar o mecanismo de busca, trazendo o conteúdo do blog do próprio Google e com a denominação “PL da Censura”.

“É algo bastante problemático pois o Google está violando seus próprios termos de uso ao fazer propagação de conteúdo político e não se autorrotulando como conteúdo desse tipo”, aponta a advogada Sílvia Piva, membro do ISOC (Internet Society Capítulo Brasil), organização que atua em defesa da neutralidade da rede.

Com toda a polêmica, a votação do PL foi adiada. Defensores do projeto apontam que se aprovado, pode ajudar a barrar os discursos de ódio na rede, a desinformação e outras propagações de informações e conteúdos criminosos. Já os críticos, apontam o cerceamento da liberdade de expressão.

Ecoa ouviu advogados especialistas em direito e comportamento digital para compreender os pontos envolvidos no PL Das Fake News:

O QUE É O PL DAS FAKE NEWS?

Entre os principais objetivos do PL das Fake News está a criação de novas regras para regulação de conteúdo nas redes sociais e outras plataformas digitais e trazem duras penalidades para as companhias que não agirem para prevenir práticas ilegais dentro dos seus serviços, que estarão sujeitas a multas de até 10% do faturamento (dentro do grupo no Brasil) – caso não cumpram com a lei.

“O projeto quer limitar o poder dessas redes e empoderar cidadãos, criando uma lei de transparência, garantindo direitos e deveres de todos. E responsabilizando as redes para que se possam ter ações em casos específicos e que elas tenham as possibilidades e dever de combater e remover conteúdos ilegais”, aponta Piva.

MAS O QUE MUDA COM O PL DAS FAKE NEWS?

Atualmente, o Marco Civil da Internet prevê que as empresas não são responsabilizadas pelo conteúdo criado por terceiros – sendo obrigadas a apenas excluir o conteúdo em caso de decisão na justiça.

Se aprovado, o PL permitirá que as plataformas sejam responsabilizadas civilmente pela circulação de conteúdos que se enquadrem em determinados crimes já tipificados pela lei brasileira, como racismo, crimes contra o Estado Democrático de Direito, atos de terrorismo, crimes contra crianças e adolescentes e violência contra a mulher.

As empresas poderão ser punidas se o conteúdo for patrocinado ou impulsionado ou se falharem em conter a disseminação dele, obrigação prevista no chamado “dever de cuidado”.

“As plataformas vêm se mostrando um lugar muito fértil para discurso de ódio, difusão de mentiras e ameaça a grupos. Pelos relatos recentes da tentativa de golpe em oito de janeiro que toda movimentação foi feita por meio dessas plataformas, assim como ataques em escolas”, aponta Piva.

Para garantir que as plataformas cumpram essas obrigações, o PL das Fake News exige que produzam relatórios de avaliação de risco sistêmico e transparência, que serão usados para fiscalizar o cumprimento de determinadas obrigações e garantir a liberdade de expressão, informação e imprensa.

Se for identificado “risco iminente de danos à dimensão coletiva de direitos fundamentais” ou “descumprimento das obrigações estabelecidas”, poderá ser acionado um “protocolo de segurança” por até 30 dias – se falharem durante esse período, as companhias poderão ser punidas.

O PL também prevê a remuneração de conteúdo jornalístico e de direitos autorais de músicas e vídeos — o que tem unido alguns artistas em favor da proposta.

No entanto, o PL ainda estabelece que parlamentares tenham imunidade parlamentar. Isso implica que conteúdos, mesmo que criminosos ou falsos, publicados por esses permaneçam nas plataformas e sem margem para punição.

“A liberdade de expressão é um direito fundamental e que a constituição busca proteger, mas não pode ser confundida para abrir margem para discursos violentos e contra minorias”, alerta Piva.

QUEM IRÁ FISCALIZAR E SERÁ QUE EXISTE RISCO REAL DE CENSURA?

Piva lembra que existem pontos “polêmicos”, e acredita que é preciso olhar com atenção quem será o órgão fiscalizador. Mas lembra que a PL prevê a criação de um órgão chamado Entidade Autônoma de Supervisão.

“Essa entidade vai atuar juntamente com o Comitê Gestor da Internet no Brasil, que é respeitado internacionalmente e tem quase 30 anos”, lembra.

Para advogada que atua estuda a neutralidade da rede, os críticos ferrenhos do projeto que apontam uma possível censura do governo estão equivocados.

“É justo se preocupar que toda instituição precisa de um órgão regulador, mas a meu ver é falsa essa ideia de que será um órgão que será usado pelo governo para trazer uma espécie de censura”, defende Piva.

Para Fabrício Posocco, advogado e professor universitário das disciplinas de direito civil e digital, o PL das Fake News também é muito importante para que algumas questões sejam regulamentadas, como entender de fato o que é fake news.

“Mas talvez um grande problema seja a capacidade técnica dessas plataformas de fiscalizar e fazer essa filtragem como o PL está exigindo”, comenta.

Reportagem: Giacomo Vicenzo/UOL