23 de junho de 2022
Um comerciante, de 39 anos, foi liberado em uma audiência de custódia (com um juiz) após ser preso por abandono de incapaz com resultado de morte. A filha dele, de 6 anos, morreu ao cair do 12º andar de um prédio, no bairro Canto do Forte, em Praia Grande, na madrugada de sábado (11/6).
Ao g1, o delegado do caso e advogados disseram que quando há abandono de incapaz dificilmente é concedido o perdão judicial.
O delegado Alexandre Comin explica que o juiz que liberou o pai não deu nenhum tipo de sentença, apenas permitiu que o indiciado possa responder em liberdade. Para isso, no entanto, ele deve cumprir uma série de condições, como comparecer bimestralmente em juízo para informar as atividades.
“Ele [o juiz] não entrou em nenhum tipo de mérito a respeito da pena. Esse perdão judicial seria uma isenção de pena, mas não tem nada a ver com abandono de incapaz, e sim com homicídio culposo [sem intenção de matar]. Nessa situação, [de homicídio] quando a pena do sofrimento do agente é muito maior do que a pena criminal, o agente fica isento da pena criminal, mas é para homicídio culposo e ele [o pai da menina] foi enquadrado no crime de abandono de incapaz com resultado morte, que não prevê isso”, ressalta Comin.
O delegado destaca ainda que o juiz pode deslocar o crime de abandono de incapaz para homicídio culposo, “caso entenda que a conduta não foi de abandono”.
O advogado Fabricio Posocco reforça que o perdão judicial só é aplicado quando tem homicídio culposo. “O vínculo afetivo é muito levado em consideração quando se fala em perdão judicial. Significa, na verdade, que o próprio estado que faz a punição renuncia da aplicação da pena daquele crime”.
“A grande discussão sobre essa questão de aplicação judicial é que o perdão judicial só está previsto nessas situações legais, ou seja, seria aplicável nos crimes de homicídio e lesão corporal culposa, então existem algumas discussões, se poderia ser aplicado nesse caso específico [do pai]”, disse Posocco.
Ainda de acordo com o advogado, a defesa do comerciante irá discutir se existe ou não a possibilidade, porém é algo que ficará à critério do magistrado. “À primeira vista, analisando friamente o caso, salvo o melhor juízo, essa ideia de aplicação do perdão judicial para esse caso em especial não será permitida por ausência de previsão legal objetiva, mas aí a defesa da tese dos advogados vai poder fazer toda uma tese de argumentação e quem sabe convencer o magistrado de modo diferente se for o caso”.
O QUE É AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA?
A audiência de custódia consiste no direito que todo preso tem de ser levado à presença de uma autoridade judicial em um prazo de 24h contados da data da prisão.
Esse procedimento serve para avaliar as circunstâncias em que a prisão foi realizada e para examinar os aspectos de legalidade formal e material do auto de prisão. “Vão ter que observar como essa prisão foi feita, se está legalmente formal, se todos os requisitos da lei foram observados”, disse Posocco.
O advogado acrescenta que essa audiência, inclusive, é obrigatória em todas as modalidades de prisão e não apenas nos casos de flagrante. “Ela tem que acontecer, por base na lei, em todas as modalidades, ou seja, aconteceu uma prisão, o preso tem que ser levado à presença do juiz”, disse.
Para o advogado, o pai da criança de 6 anos que morreu após cair do 12º andar foi liberado durante a audiência de custódia porque os requisitos do art. 312 do Código Penal não estão presentes nesse caso, por isso, ele não precisa aguardar preso até o final do julgamento.
“Ele deve ser uma pessoa primária, com bons antecedentes, não tem envolvimento com o mundo do crime, não coloca em risco a sociedade, não coloca em risco o próprio processo, como ameaçar testemunhas e sonegar provas”, afirmou.
Posocco enfatiza que a liberação durante a audiência de custódia não torna a pessoa isenta do crime. Assim que o inquérito policial for concluído será encaminhado ao Fórum e um promotor de Justiça vai avaliar se oferecerá ou não a denúncia para que o processo penal comece a correr no judiciário.
Reportagem: Brenda Bento/g1 Santos